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Red Pass

Rumo ao 38

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Rumo ao 38

Pacheco. "Resumindo: o Queiroz não presta mesmo para nada"

A carreira que nasceu em Portimão, cresceu na Luz e morreu em Alvalade

 

 

Amanhã é dia de Portimonense-Benfica e nada melhor do que falar com quem esteve nos dois lados da barricada. António Pacheco, sportinguista de coração, recorda uma carreira que arrancou na Luz com o "inteligente" Eriksson e que acabou no Sporting com o "incompetente" Queiroz. "Foi com ele que começou o meu declínio", diz. Anda, Pacheco.

Com apenas um ano de primeira divisão, passou de Portimão a Lisboa.

Em 1986/87 joguei na primeira divisão no Portimonense e no ano seguinte fui para o Benfica. Lembro-me de ter jogado duas vezes com o Benfica no intervalo de uma semana e deve ter sido isso que me levou para a Luz. A adaptação foi difícil porque eu sofria de pubalgia e tal... Havia clubes interessados em mim, alguns que até me davam o dobro do que fui ganhar em Lisboa, mas optei pelo Benfica. Fiz quatro malas e fui de comboio ter com um amigo a Lisboa e vivi com ele até ter a minha independência. Porquê o Benfica? Porque tinha valor para ser titular e eu, sportinguista, confiava no sucesso do clube. É que o que dava a ganhar dinheiro era o prémio de jogo - por cada vitória, o jogador que participasse recebia 500 euros.

E a adaptação a Lisboa e ao Benfica?

Difícil, porque estava limitado por causa de uma pubalgia. Mas também não era fácil, porque estava sozinho numa cidade como Lisboa. Era como sair de uma aldeia para outro país. Não se esqueça que não havia nada, só a televisão. Ficava em casa a ver TV no início. Telemóvel não havia e se quisesse falar com outras pessoas ou combinar tinha de estar em casa. E como não tinha carro próprio tinha de andar de transportes. De táxi, que os autocarros tinham números a mais e baralhavam-me. Depois, no clube, também não foi muito fácil. Os mais velhos, os consagrados, não davam confiança aos mais novos, cada um tinha o seu lugar marcado nos balneários, nos autocarros, nas mesas. A maioria deles nem me conhecia e os plantéis tinham trinta e tal jogadores - não se esqueça que havia o campeonato de reservas, para onde fui parar nos primeiros meses. O respeito conquistava-se, meu amigo. Quando íamos jogar fora, tínhamos de esperar que jogadores como o Bento, o Chalana, o Shéu, o Diamantino, o Águas ou o Carlos Manuel escolhessem o lugar no balneário. O meu lugar era sempre aquele que sobrava [risos], era onde me deixassem sentar. E esses eram gajos de quem eu coleccionava as caras nos cromos para as cadernetas um ano antes - a minha vida realmente mudou muito. Mas lá fui começando a jogar com o Skovdahl [treinador dinamarquês mais tarde substituído por Toni] e quando perceberam que podia ser decisivo para o grupo, acolheram-me. Fora dos treinos, andava com o Dito e nos dias de folga era certinho, íamos a este ou aquele bar ou discoteca beber uma cervejinha.

Nessa época (1987/88) chegou à final da Liga dos Campeões, com o PSV e o penálti falhado de António Veloso.

Foi um jogo muito táctico - eles tinham uma grande equipa, com vários internacionais holandeses e dinamarqueses. Aguentámos 90 minutos, 120 minutos, e perdemos nos penáltis. E eu nesse jogo até tive uma oportunidade de golo numa correria mas saltou-me a chuteira na altura de rematar! [risos] Caramba! Andávamos à procura de um golo e eu quando mais precisava saltou-me a bota, o pneu. Fiquei sem aderência [gargalhada]. Era muita velocidade para aquelas botas! Depois, fiquei triste pelo Veloso porque ele era como um relógio suíço: nunca jogava mal, era sempre certinho e fiável. Mas foi pena, porque só sofremos um golo nessa campanha europeia e foi o pai do Gudjhonsen [Arnor] a marcar-nos de livre pelo Anderlecht.

Depois vem Eriksson, com quem manteve uma relação curiosa.

Sempre me dei bem com ele. O Eriksson gostava muito de falar comigo à parte, chateava-me muito a cabeça com isto e aquilo porque acreditava no meu talento. Dizia que eu tinha grandes condições para ser dos melhores. Só que eu era muito teimoso - sempre fui - e não gostava nada que ele me andasse a repreender à frente do resto do plantel. "Este gajo não gosta de mim", pensava eu. Só que depois, lá me caía a ficha e compreendia o que ele queria dizer com aquilo.

Ele filmou um treino seu, certo?

Ahh [gargalhada]. Essa é uma história muito engraçada e mostra a capacidade intelectual do Eriksson. Ele lá deve ter compreendido que isto não ia lá só com palavras. Foi num dia em que tivemos dois treinos: o primeiro, de manhã, foi muito físico, a puxar pelo corpo. O segundo foi mais descontraído, com um meinho, uma pelada, coisa leve. E ele pôs o adjunto Jorge Castelo a filmar esse treino com uma câmara, escondido numa bancada a focar o que eu andava a fazer num plano muito fechado. E eu 80% do tempo da filmagem andava a passo [gargalhada]. Ele mandou fazer a cassetezinha e chamou-me ao gabinete: "Tenho aqui uma coisa para oferecer-lhe." E eu a pensar com os meus botões: "Ai, o que é que este gajo vai agora inventar?" Lá fui e ele deu-me uma cassete de vídeo embrulhada: "É o vídeo de um filme que gostaria que você visse." E eu: "Mas para quê? Bom... Ok, tenho lá um vídeo em casa, vou ver." Vi a filmagem e lá andava eu a passo no meinho e na peladinha. Depois, o Eriksson voltou a chamar-me: "Então, gostou do que viu?" E eu: "Não, não gostei." E ele respondeu: "Por isso é que você não joga tanto: tem de deixar de andar a passo e correr mais." Há uns tempos reencontrei-o: ele veio cá a Lagos e entrou num táxi com uns amigos suecos a perguntar onde é que se podia beber um copinho (e talvez outras coisas mais depois disso [risos] mas isso já não era comigo). O taxista disse-lhe que conhecia um sítio calmo e que o dono era o Pacheco. E o Eriksson perguntou-lhe "Que Pacheco?" e o taxista respondeu: "O Pacheco do Benfica."

E a outra final perdida, com o Milan?

Custou-me muito mas aquele era o Milan de Van Basten, Gullit, Rijkaard, Baresi, Costacurta, Maldini...

Porque saiu do Benfica?

As pessoas dizem que foi por dinheiro mas não foi. O problema é que o grupo começou a ficar dividido quando os russos chegaram. Eles tinham atitudes dentro e fora do clube que não eram bem vistas pelo grupo dos mais velhos. Eu já tinha seis anos de Benfica e sabia o que era a mística que se andava a perder. O Paneira, por exemplo, andava a ser mal tratado. Foi o início da presença dos agentes de futebol, que exigiam que os seus jogadores fossem titulares. Mais: foi a altura em que os jogadores deixaram de ser jogadores para se tornarem "activos". Eu gosto muito do Toni, sempre gostei, mas às vezes a costela benfiquista dele falava mais alto do que a equipa. O Rui Costa estava na nossa linha contra essas coisas: os directores protegiam o Kulkov e o Yuran e diziam que a culpa era dos mais velhos. Decidi sair antes do "Verão Quente", não sabia para onde ia e só falaria com outro clube quando estivesse fora da Luz. Só que era complicado porque tinha dois anos de contrato - foram os problemas financeiros que me deram uma razão legal.

Chegou ao Sporting de Robson com uma equipa de talentos que não deu em nada.

A coisa começou a correr mal no dia em que o senhor Sousa Cintra decidiu chamar o "visionário mor" do futebol.

Carlos Queiroz?

Claro! E vinte e tal anos depois nós vemos que tipo de relação tem com os jogadores, os jornalistas... E com ele próprio: o homem está em guerra com ele próprio. Tudo o que aconteceu com a selecção agora eu previ. Ele é horrível: em termos de relações humanas ele está completamente desadequado com a posição que ocupa. Fazia chantagens, diferenciava os jogadores... Era mau. Lembro-me que deixei de ir à selecção porque ele era seleccionador: eu pedia ao Toni para dizer-lhe para não me convocar porque vinha de lá completamente desorientado. Ele trata os jogadores de forma simpática mas, na minha opinião, muito cínica. Certa vez tive um processo disciplinar imposto por ele no Sporting. Nesses casos temos de arranjar testemunhas e eu escolhi três colegas meus. E o Queiroz disse a um deles que se fosse testemunha não lhe renovaria o contrato. O processo disciplinar dizia que eu faltara a uma convocatória. E que convocatória foi essa? Dormir no hotel! Só que essa convocatória não foi feita de forma oficial e curiosamente foi numa noite em que ganhámos ao Benfica por 1-0, no dia do meu aniversário. Eu, que nunca era convocado para nada, fui convocado para ir dormir no hotel! Houve também um jogo, para o qual não fui convocado, nas Antas, em que houve confrontos porque os jogadores não o queriam ouvir sequer no balneário, ao intervalo. Dá-me a ideia que houve quem se recusasse a jogar. Ele não tem a mão em plantel nenhum.

E porquê essa ironia quando fala dele como "visionário"?

Oh! Então ele não se auto-intitula um visionário do futebol? Ele faz projectos para dez anos, não é? Está-se mesmo a ver que no Mundial-2018, que pode ser organizado cá e para o qual Portugal é automaticamente apurado, o mérito será todo dele mesmo que o Mourinho seja o seleccionador na altura. O sucesso não será fruto do trabalho do Mourinho mas do que ele andou a fazer aqui em 2010, obviamente - é assim que o Queiroz pensa. O currículo dele é uma Taça conquistada frente ao Marítimo. Resumindo: o Queiroz não presta mesmo para nada.

Arrepende-se de ter saído do Benfica.

Desportivamente, claro. A minha carreira morreu no Sporting. Mas também a culpa foi minha porque quis sair do Sporting: devia tê-lo deixado cair sozinho. Graças a Deus nunca mais falei com ele. Saí do Sporting e tentei a minha vida no estrangeiro porque em Portugal estava queimado por aqueles que estavam ligados ou ao Benfica ou ao Sporting. Fui para Inglaterra e andei à experiência no Aston Villa do Yorke e do Southgate e não deu em nada; depois estive quatro meses no Nottingham e fiz uns jogos de reservas. Voltei com a noção de que não ter um empresário me tinha prejudicado. Até que o João Alves me chamou para o Belenenses, uma decisão que me parecia boa mas que correu mal por questões pessoais que não quero, não posso adiantar. Tem a ver com o treinador.

Não pode ou não quer?

Não quero, não insista.

E como é que apareceu a Reggiana?

Um empresário ligou-me e eu fui lá para fazer uns testes. Não sei porque carga de água é que se lembraram de mim mas enfim, foi bom. Deram-me um contrato de um ano com o compromisso de que se não rendesse nos primeiros três meses sairia do clube. Fiquei e ainda fiz 17 jogos, a jogar ao lado do "El Tren" Valencia que era louco. Depois, voltei quando a Reggiana desceu de divisão e ainda tive uma passagem pelo Santa Clara e uns tempos divertidos no Atlético e no Estoril.

Por gozo, que o pé-de-meia estava feito.

Completamente. Já tinha os meus investimentos e um dinheirinho de parte. Os últimos tempos foram para me divertir. Depois pendurei as botas e ainda treinei o Portimonense. Mas não me considero treinador porque não ando à procura de clubes para trabalhar. Se aparecer um, tudo bem. Senão, tranquilo na mesma porque tenho o meu bar-restaurante que me dá muito trabalho (não sou patrão de ficar por casa) e sou representante de uma marca de aquecedores de baixo consumo.

 

in Jornal I

Michael Manniche em Entrevista ao I

Manniche foi um dos jogadores que eu mais idolatrei na minha infância. Chegou ao Benfica na altura em que me tornei sócio para poder ver todos os jogos no estádio da Luz. Ele e Stromberg foram os responsáveis por eu desejar ser louro aos 10 anos para deixar crescer o cabelo e jogar como eles. Estive na Luz no famoso jogo com o Liverpool na 2a mão da Taça dos Campeões. Depois de perdermos em Inglaterra por 3-1 (3 golos do terrível Rush) começámos o jogo na Luz a vencer com um penalti marcado por Manniche. Estivemos muito perto de fazer o 2o golo mas o resultado ficou em 1-0. Tive que esperar 20 anos por uma vingança. Desses tempos ficaram a simpatia pela equipa do Liverpool e a eterna admiração pelo dinamarquês que não dava 5 toques seguidos na bola e cabeceava de olhos fechados.


Michael Manniche fala três línguas mas só se expressa correctamente em dinamarquês, numa sonoridade que se assemelha à de uma máquina de flippers. O seu inglês tem altos e baixos e o português só aparece em palavras soltas, como "sócios", "Benfica", "Cascais", "restaurante Pimentão" e "canina". Alto e louro, Manniche foi o quinto estrangeiro de sempre a jogar no Benfica, depois dos brasileiros Jorge Gomes e César (1979-80), do jugoslavo Filipovic (82-83) e do sueco Stromberg (83-84).

O avançado dinamarquês chegou à Luz no Verão de 1984, na era Fernando Martins. Veio do Hvidovre, onde foi campeão dinamarquês, em 1981, e somou 23 golos em 77 jogos. Ainda antes de tocar na bola, Manniche já causara impressão no aeroporto. Media 1,96 metros de altura e tinha um arcaboiço pouco comum para um jogador de futebol. Ainda por cima, em Portugal, onde a selecção nacional acabara de brilhar no Euro-84 com seis jogadores do onze da meia-final com a França abaixo do 1,75. Está a ver o impacto, não é verdade? Mas pronto, Manniche vinha da Dinamarca, um país futebolisticamente sem expressão, e falou-se numa aposta falhada de Fernando Martins. Puro engano. Em quatro épocas na Luz, duas deles (a primeira e a última) em que não foi titular assumido, Manniche não só ganhou seis títulos (dois campeonatos, três Taças de Portugal e uma Supertaça nacional), como ainda marcou 75 golos em 132 jogos. Um desses golos foi ao Liverpool e valeu uma vitória (1-0) sobre a equipa que o Benfica defronta esta quinta-feira para os quartos-de-final da Liga Europa. Mote mais que suficiente para uma viagem ao passado. Em dinamarquês (ou flipperês, whatever), inglês e português. Mas sempre a rir, porque o homem é alto, louro e divertido. E aí está uma característica pouco conhecida dos dinamarqueses.

Boa tarde, é o Manniche?

Plim, plam, plim (deve ter sido "sim" em dinamarquês).

Daqui Rui Miguel Tovar, de Portugal. Tudo bem?

Ahhh, claro, claro. De que jornal és?

Do i, que nasceu em Maio do ano passado. Somos um jornal generalista. Política, economia, cultura, desporto...

Ahhh, boa, boa. E o que queres?

Quero falar contigo sobre o Benfica-Liverpool. Há uns anos marcaste um golo e o Benfica ganhou.

E era tão bom que isso se repetisse, mas com happy end. Porque nesse dia em que marquei, nunca mais me esqueço, fomos eliminados. Tínhamos perdido 3-1 [hat trick de Ian Rush a responder à "ousadia" de Diamantino] em Anfield e precisávamos de 2-0 para passar. O penálti foi muito cedo, aos cinco minutos, julgo eu, numa falta do Grobbelaar sobre o Jorge Silva. Portanto tivemos 85 minutos para marcar o 2-0 mas ele nunca chegou e lembro--me como se fosse agora (o "agora" dito em português) que os adeptos do Benfica nos aplaudiram no final do jogo, que acabou dez para dez, com as expulsões de Pietra e Dalglish, ao mesmo tempo, no final da primeira parte. Nessa altura o Benfica era bom e o Liverpool era fortíssimo. Aliás, era o campeão europeu e também chegou à final da Taça dos Campeões desse ano. Agora há um maior equilíbrio de forças e é até o Benfica quem está por cima do Liverpool em confiança, ritmo e jogo.

É verdade que "Tosco" era a sua alcunha na Luz?

Toscooo [pergunta com sotaque inglês]? Sim, lembro-me disso. Mas não é uma coisa muito boa, pois não?

É como se fosse desajeitado.

Ah ah ah [grandes gargalhadas, seguidas de uma explicação em dinamarquês a pessoas ao seu lado e aí explosão de gargalhadas em conjunto]. Tosco, ok! Sim, as pessoas começaram a chamar-me isso no início, porque havia Filipovic e Nené, porque eu não era titular e porque não conseguia dar cinco toques seguidos na bola, mas depois melhoraram e cheguei a ser chamado "canina", por graça. Não há um internacional português que tem o meu nome?

Sim, o Maniche.

Pois, mas só com um "ene". Que isso dos dois "enes" é um exclusivo meu. Nada de confusões entre ele e eu [e mais gargalhadas]. E ele não me parece nada toscooo. Pela forma como jogou no Euro-2004 e no Mundial-2006... Para acabar isso do toscooo, nunca ninguém me chamou isso directamente, mas às vezes ouvia, na rua, num restaurante.

Onde é que vivia?

Cascais [e o tom de voz sobe alegremente]. Fora de Lisboa mas tão perto e tão bonito... Foi o Benfica que escolheu a minha casa, porque lá eu ficava ao lado de Stromberg e Eriksson.

Mas então como é que um dinamarquês se entendia com dois suecos?

Sou uma desgraça para a nação. Admito. Eh eh. Repara no meu dia-a-dia. Ia para os treinos e vinha para casa com o Stromberg, a percorrer aquela linda marginal, e depois jantava com suecos, que nada tinham a ver com futebol. Eram vizinhos e depois tornaram-se amigos.

E havia algum restaurante de eleição?

Sim, o Pimentao [é Pimentão, claro]. Os peixes, as sobremesas. Ui ui, fantastic!

Mais alguma coisa?

Sim, os almoços e jantares com os jogadores do Benfica. Grandes tempos. Pietra, Álvaro, Bastos Lopes, Humberto Coelho, Oliveira, Diamantino, Carlos Manuel [ver caixa]. E as festas do Stromberg?

Então?

Eram do caraças [diz em português, outra vez com o tom de voz alegre]. Ele era um óptimo anfitrião.

E dentro de campo?

O maestro a comandar aquele Benfica sensacional. Jogávamos de olhos fechados.

E lá na frente, como é que era?

Levava porrada de meia-noite [novamente em português].

De quem?

Bolas, Lima Pereira [FC Porto] e Venâncio [Sporting, ver caixa ao lado]. Eram bons centrais, mas sofri entradas por trás completamente loucas. Eram outros tempos, em que não havia lei.

E mais?

Ganhava muitas bolas de cabeça. Era o canina, não era?

É verdade que um dia marcou um golo de cabeça de fora da área?

Ah sim, sim. Ao Sporting do Damas, mas nem me fales dessa tarde em que perdemos em casa [2-1, com Morato e Manuel Fernandes a surpreender Bento, a 13 de Abril de 1986, na primeira vitória do Sporting na Luz desde 1965] e deixámo-nos ultrapassar pelo FC Porto do Artur Jorge, na penúltima jornada. Eles foram campeões nacionais uma semana depois e campeões europeus na época seguinte.

Mas nessa época, 1985-86, o Benfica acabou a época a ganhar a Taça de Portugal. Nem tudo foi mau.

Sim, de acordo, mas o campeonato estava quase, quase. Foi uma pena. A Taça de Portugal foi um consolo. Ganhámos 2-0 ao Belenenses no Jamor.

Perto de casa, então?

Ahh, pois é. Mas não cheguei lá de carro, porque o Stromberg já estava na Atalanta e porque houve estágio num hotel. Cheguei de autocarro. Mas nessa tarde não marquei, apesar de ser titular.

Sim, mas já tinha brilhado no Jamor, na época anterior.

Pois, é verdade, foi no tal ano em que bati o Grobbelaar, do Liverpool, de penálti. Nessa final marquei dois ao FC Porto [3-1]. Tenho óptimas recordações da Taça. Em quatro épocas joguei três finais. Só falhei a de 1984, na época de estreia, porque fomos eliminados pelo Sporting, em Alvalade [1-2 nos oitavos, com golos de Carlos Manuel 8', Jordão 58' e Manuel Fernandes 78']. Duas épocas depois vingámo-nos [5-0 ao Sporting na Luz, nos quartos de final, com golos de Rui Águas 11', Wando 40', Álvaro 84', Manniche 86' gp e novamente Wando 90'], depois de eliminar o FC Porto [2-1 na Luz]. A Taça era óptima para mim porque marcava muitos golos [18 jogos e 22 golos, quatro deles ao Ponte da Barca, três ao União de Santarém, outros três ao FC Porto, este em eliminatórias diferentes, e mais três ao Vialonga].

E qual foi o melhor golo?

Difícil. Gostei de um ao V. Guimarães, em que fiz um chapéu com a parte... Como se diz aí?... Trivela. Promete que não diz nada ao guarda-redes?

Sim, prometo.

Era o Silvino. Na minha última época na Luz [86-87] ele jogou comigo, mas nesse 8-0 ele não teve a mínima hipótese. Estava adiantado e aproveitei.

Agora é que é para a despedida. O que diz ao seu anúncio da Robbialac?

Então, se o Eriksson fez um Macieira, com aquele chapéu, porque é que eu não podia? É como o chapéu ao Silvino. Tentei a minha sorte mas já nem sei o que dizia no anúncio. Na altura arranhava o português.

Pois... Abraço

Até já [português com sotaque de Cascais].


Maniche no Vedeta ou Marreta

Lima, o Herói de Marselha



Em entrevista à Bola:

«No Benfica não joguei metade do que sabia»
Por

nuno paralvas

Oque é feito de si? Há muito que não se ouve falar do Lima que marcou o golo em Marselha na meia-final da Taça dos Campeões.

— Olha, moro em Belo Horizonte há 12 anos. Durante muito tempo não quis nada com o futebol. Não tenho perfil para treinador, sabe? Sou muito acelerado. Tenho uma empresa de engenharia e trabalho em rodovias. Há cinco anos estou ligado ao Grémio, observando guris (jovens). Levei um garoto de 13 anos para o Grémio, há três meses, que vai rebentar como Robinho e Ronaldinho. Chama-se Wildson, mas botei só o nome de Wil. Quando o vi jogar os meus olhos encheram-se de lágrimas.

— Vive bem?

— Depois de o futebol acabar, as coisas batem na pele. Mas levo uma vida tranquila.

— Ainda fala com o Manuel Barbosa, que o trouxe para o Benfica?

— Não. Lembro-me que estava num hotel no topo da avenida de Lisboa [Av. da Liberdade] e dizer-lhe que não ia assinar. Ninguém queria pagar os meus 15 por cento. Recebi metade.

— É verdade que o comandante do avião deu uma volta sobre Lisboa para o Lima ver o Estádio da Luz?

— Viajei com o Nuno Graciano [apresentador da SIC] e o pai dele era o comandante. Chamou-nos à cabine para dar essa volta. Mas, cara, eu grito e choro no avião. As viagens para a Madeira eram um desespero. Eu xingava de pavor, rasgava as calças vendo o avião batendo as asas. Aquilo era um sufoco.

— O que recorda desse tempo?

— Não sei dizer, cara. A gente no Brasil recebe o estrangeiro com Carnaval e churrasco. O povo português não é bem assim e a gente sente isso. Levei um ano a adaptar-me. O Benfica tinha quatro ou cinco brasileiros, mas ficava difícil. No início dava-me melhor com o Vata e Samuel. Talvez fosse a concorrência. Depois tudo ficou na paz.

— Mas não teve boas memórias?

— Entrar no Estádio da Luz com o Eusébio foi (pausa). Era como estar com o Pelé, cara. Sempre tive alegrias na vida e o golo em Marselha foi uma das maiores. Deixou-nos quase na final. E eu abri a capa da France Football. De repente, é uma coisa especial. E depois tudo começou a fluir para mim no Benfica.

— Como foi o golo em Marselha?

— Foi de cabeça. Voei em cima do Mozer. Eles tinham o Papin e uma equipa formidável. Mas também marquei dois ao Dniepr. Não consigo perceber como um clube tão grande não arma uma equipa para se bater com os grande europeus. Precisa de craques. Luisão deu algum equilíbrio. Tem mais brasileiros?

— Ramires [interrompe]

— É menino humilde e espectacular. Quando sentiu que podia fazer golos, foi na frente, descobriu o lado bom do negócio.

— Como era a sua relação com Toni?

— Nunca tive problema. Mas ele gostava mais do estilo de outros. Depois, o Eriksson tinha aquela coisa com os suecos. Na disputa com Magnusson, era ele que jogava.

— Diziam que era molengão e gostava de mais de tocar violão?

— No Benfica, não joguei metade do que sabia. No Brasil, tinha média de 35 golos por ano. Se fosse português talvez tivesse sido um rei. Molengão? Nunca simulei nada, juro pela felicidade dos meus filhos. Na final com o Milan, estava lesionado. Violão? É melhor tocar violão do que beber e fumar na noite.

— A sua imagem prejudicou-o?

— Era moda. No sul do Brasil, jogador tem de ser macho. Eu ia de blazer e gravata para os treinos. E fui o primeiro a botar brinco de brilhantes, na fonte de Roma [Fontana di Trevi], numa digressão do Grémio. Falavam que homem não podia. Mas era tudo bafafá [barulho].

— Diziam que era veado.

— Era estilo. Nunca falaram que andava com a mulher mais bonita de Portugal. Ela morava em Cascais, parecia uma cigana, cabelos longos pretos e olhos azuis. Nossa, era uma loucura. Quando entrei no Grémio a torcida do Inter gritava Lima veado, mas não me intimidava. É a mesma coisa quando xingam os árbitros.

— Gostava de enviar alguma mensagem aos benfiquistas?

— Quero desejar toda a sorte do mundo ao Benfica. O povo merece. Ai, aquele Terceiro Anel e aquele vermelho são marcantes de mais. Não devia ter saído. Foi a coisa mais marcante da minha vida. Gostaria de colaborar com o clube. Você passa o meu número para o Shéu?



Resumo do Marselha 2 - 1 Benfica (golo de Lima):

Marselha-2 Benfica-1 de 1990
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Lembram-se de Ricky?


Ricky com Ricardo Gomes

O jornal I encontrou Ricky e apresenta hoje uma bonita entrevista com o ex-jogador do Benfica que vale a pena ler. Destaco esta parte:

Paciência que foi coisa que não teve quando a dupla Toni/Jesualdo o lançou a titular no Benfica, não foi?

Ah, já entendi. Esse jogo dos 14-1 ao Riachense calha por estes dias, não é?

Sim, foi a 11 de Janeiro de 1989.

Xiii, há 21 anos. Sim, claro que me lembro desse jogo. Mas essa história tem de ser bem contada aos adeptos, sobretudo aos benfiquistas. Estava em França, a jogar na 1.a divisão pelo Metz [oito golos em 32 jogos durante 1987-88], quando o empresário português Lucídio Ribeiro me negociou para o Benfica, tinha eu 27 anos. Só que tive um azar tremendo e parti a perna no meu primeiro jogo, durante o estágio nos EUA. Não me lembro do adversário. Só sei que foi em Nova Iorque, no Giants Stadium. Fiquei arrumado e nunca pude evidenciar a minha pontaria pelo Benfica.

Nunca, não! Nesse jogo de Taça, foi um ver se te avias.

Sim [risos], nessa tarde fiz tudo o que podia. Tinha acabado de regressar após a lesão e estava ligeiramente desanimado pois perdera os dois primeiros jogos oficiais [1-2 com Boavista na Maia, a 31 de Dezembro de 1988, e 0-1 em Penafiel, uma semana depois]. Aquele jogo com o Riachense era importantíssimo.

Do que é que se lembra desse jogo?

Bem, além de conseguir a espantosa marca de seis golos, dois na primeira parte e quatro na segunda, lembro-me de uma tarde de Inverno com sol, da minha camisola vermelha com o número 9 nas costas, patrocinada pela Fnac, e dos adeptos numa gritaria danada, muito por culpa dos milhares dos torcedores do Riachense. Sabe que o golo deles foi no último minuto e os adeptos festejaram como se fosse a decisão do Mundial? Aí, percebi a grandeza do Benfica. E também a do Bento, um senhor guarda-redes [que foi junior no Riachense]. Era ele que estava na baliza e foi a ele que eles [Tochinha, um jovem fundador metalúrgico, futebolista nas horas vagas] marcaram. Também me recordo daquele esquerdino que veio do Portimonense... até jogou na selecção portuguesa... isso, o Pacheco! Ele foi espectacular, baralhou toda a gente e ofereceu-me sei lá quantos golos. Cá fora, demorei mais de 30 minutos para sair do Estádio. Eram tantos pedidos de autógrafos! Só no dia seguinte é que percebi que o Benfica tinha batido o seu recorde na Taça [datado de Abril de 1949, com 13-1 ao Académico de Viseu]. E eu fiz parte dessa história [Direito, autogolo, Ademir-2, Pacheco-2, Lima, Garrido e Miranda também marcaram].

Mas depois nunca mais jogou!

É verdade. Nessa época, marquei seis golos em seis jogos, cinco deles incompletos [ao todo, foram 210 minutos, o que dá um golo por cada 38'], porque a concorrência era enorme. Havia o Vata, que se sagrou melhor marcador da 1.a divisão nessa época [16 golos, 18 com a Taça de Portugal] e ainda o Magnusson [nove no total]. Sem esquecer o central brasileiro Ricardo Gomes [oito, todos no campeonato]. Não havia espaço para mim naquele Benfica que se sagrou campeão nacional, e que só não teve direito a dobradinha, com a Taça, devido àquele livre do Juanico, do Belenenses.

Amaral - o Coveiro Recorda os Tempos da Luz no I

Na sequência dos JO, veio para o Benfica. Como foi?

Em Portugal, o FC Porto, com Zahovic, Jardel e Drulovic, dominava a cena mas o Benfica continuava a ser o maior. Eu ia à casa do Benfica na Suíça, lá na China ou onde fosse, e era uma multidão de pessoas que aguentava até altas horas da noite a chegada dos jogadores e dos dirigentes. Nós, com Preud'homme (que pegava todas as bolas, até nos treinos), Valdo, João Pinto, Nuno Gomes, estávamos em crise mas enchíamos os estádios de todo o país, de Guimarães a Faro. Era impressionante. Nunca vi nada igual. É o maior clube do mundo e olha lá que já estive no Corinthians, que tem a torcida mais fiel do Brasil.

Tem alguma história curiosa no Benfica?

Logo nos primeiros dias, estava a arrumar o meu cacifo e pedi um durex [fita-cola no Brasil] à dona Paula. Ela ficou brava comigo, cara! Não sabia que Durex era camisinha [preservativo].

Já voltou a Portugal?

Fui a Lisboa no primeiro Rock in Rio [2004]. Visitei o novo Estádio da Luz, claro, e disse fita- -cola, claro. Nem imagina o carinho dos adeptos. Parei muitas vezes na rua para dizer olá e conversar sobre um jogo ou outro.

Entrevista completa para ler no jornal I

Simão e o Regresso à Luz


Em entrevista ao diário espanhol As, Simão antevê o jogo da próxima terça-feira diante do Benfica, de apresentação da nossa equipa aos sócios. «Será muito especial», vinca.

«Desde que vim para o Atlético Madrid nunca defrontei o Benfica, ainda para mais no estádio onde joguei durante seis anos, onde ganhei títulos e onde todos me deram muito. Sei que serei bem recebido e ficaria feliz se fosse um grande espectáculo, para todos desfrutarmos», referiu ainda o internacional português.
Serás, pois!