As noites europeias fizeram muito pelo crescimento da mística benfiquista e da paixão ao clube de milhares de adeptos que foram passando esse amor de geração em geração. Essas noites europeias eram mágicas e marcaram a minha infância, a minha adolescência e boa parte da minha vida adulta.
Começaram por ser noites de mistério. Nunca sabíamos bem que nos vinha visitar à Luz, os jogadores, os equipamentos e como jogavam. Para quem vivia perto do antigo Estádio da Luz, como eu, eram noites de agitação mesmo antes de ter idade de poder ir ao jogo. A rumaria do povo com bandeiras e cachecóis vermelhos e brancos que enchia as ruas entre a Estrada de Benfica e os montes para lá do campo dos Pupilos do Exército. O fascínio dos holofotes ligados, coisa rara nos anos 80 em que se jogava quase sempre à tarde nas provas internas, as originais e lindas torres de iluminação da Luz que rasgavam o céu negro nocturno com um clarão impressionante que só aumentava o desejo de ali estar a quem não podia ir ao estádio. Horas à janela a olhar para aquele clarão e à espera do emocionante "bruá" que se ouvia a céu aberto a cada golo do Benfica e que a rádio logo a seguir confirmava com todos os detalhes narrados a alta velocidade.
As noite das vitórias dramáticas com o Karl Zeiss Jena, com o Liverpool e com o Dukla de Praga, as noites de glória com a Roma, com o Steaua de Bucareste, com o Marselha, aqueles jogos de primeira mão que nos deixavam desconfiados mas que depois acabavam em festa com o Arsenal, com o Leverkusen, com o Craiova, com o Betis e tantos outros.
Estas eram as noites do Benfica, quando se saía da pasmaceira da competição interna e se mostrava ao mundo o que era o Benfica. Está no nosso ADN. Deviam ser as noites mais desejadas por toda a gente.
Não sei quando é que isto deu a volta mas a verdade é que os sinais foram aparecendo nos últimos anos. Cada vez que oiço que é preciso poupar num jogo europeu porque a seguir há campeonato fico sempre baralhado. Quando comecei a ter a sorte de ver os jogos europeus na Luz, e posso dizer que desde o começo da década de 80 que não perco uma partida do Benfica nas provas da UEFA ao vivo no Estádio da Luz, era precisamente o contrário. Antes do compromisso europeu é que se poupava um ou outro jogador para a noite de gala. Até o ensaio geral costumava ser sábado à noite.
Isto mudou quando os Halmstads da vida conseguiam afastar o Benfica. Bateu no fundo quando o Benfica ficou fora das provas da UEFA dois anos seguidos. Impensável! Que dor. Depois de ter ficado fascinado pelas noites europeias, ver o Benfica fora da Europa foi das maiores decepções da vida.
Houve retoma e lentamente o Benfica lá voltou ao seu lugar europeu. Discutiu uma eliminatória com o Inter, bateu o Manchester United na Luz, eliminou o Liverpool campeão europeu em Anfield, voltou a duas finais europeias, reencontrou o seu espaço.
Depois disto, o clube entrou num impasse misterioso. Vai dez vezes seguidas à Champions League, o que é óptimo, mas de ano para ano aparece menos ambicioso no discurso e no campo. Parece que garantir a presença na competição é um fim e não um meio de voltar a fazer história internacional. O ciclo agravou-se nos anos recentes com uma série de derrotas e apenas duas vitórias contra o... AEK.
Sempre houve desculpa e os próprios sócios parecem ir desculpando os insucessos com a prioridade ao campeonato nacional. É uma postura perigosa como agora se vê.
A atitude nunca pode ser de desprezo pelas provas da UEFA e ganhar em Portugal. Também não deve ser de candidatos a ganhar a Champions League e ter um Benfica europeu até Maio todos os anos. Tem que haver um equilíbrio. E esse equilíbrio tem que começar quando se assume a importância e o peso que as provas internacionais têm no passado do clube. O Benfica nunca foi só de consumo interno. Também nunca foi um clube presente em finais europeias todos os anos, tirando ali a década de 60 e 80, mais as duas finais de Liga Europa mais recentes. Mas o Benfica cresceu muito e angariou muitos fieis graças à ilusão dos duelos europeus. Isso não se pode perder.
Um clube estável a nível financeiro como nunca esteve, ganhador a nível interno nesta última década, com uma organização invejável não pode desprezar os compromissos europeus.
Por isto mesmo, no arranque desta época ouvimos Direcção e treinador sintonizados na vontade de fazer mais e melhor na Champions League, assumir a dimensão internacional. A International Champions Cup foi um bom aperitivo mas as duas primeiras jornadas da Liga dos Campeões foram uma forte e profunda desilusão.
Bruno Lage não conseguiu transitar o futebol ambicioso que mostrou no campeonato desde que chegou para a Europa. Sente-se que o que jogamos é curto neste contexto de Champions.
Já o tinha escrito na jornada 1, o discurso não batia certo com o que jogamos. Agora é preciso reflectir. O Benfica tem que pensar em grande, tem que assumir o desafio em vez de entrar com receio, desconfiado das suas capacidades. Tem que deixar os complexos de inferioridade e assumir que é capaz.
Na Rússia só se aproveitou a estreia de Raul de Tomás a marcar. Que se parta daí para novas ideias.
Exige-se que o futebol do Benfica dê outra imagem na Europa e termine este ciclo horrível que nos consome a todos. Quanto mais depressa assumirmos que algo está errado nestas abordagens europeias, mais depressa podemos responder de outra maneira.
O Benfica não pode virar costas à Europa. Às vezes acontece o pior, como nos casos que dei das noites com o Karl Zeiss ou Dukla, mas temos que sentir a ilusão do apuramento algures na luta e não este deserto de sentimentos que nos invade invariavelmente após sofrermos o primeiro golo.
Há quatro jogos pela frente, sintam a vontade de os jogar como nós já sentimos desde os tempos das torres de iluminação acesas na velha catedral. Estas noites não podem ser de pesadelo, foram feitas para serem mágicas. O Benfica que volte a assumir essa responsabilidade de iludir e fazer sonhar. Todo o Benfica, de dentro para fora e de fora para dentro. O nosso passado assim o exige.
Tenho que começar por congratular os benfiquistas que foram à Luz ver a estreia do Benfica na Taça da Liga 2019/20. Quase 40 mil adeptos nas bancadas é muito significativo para assistir a um jogo da terceira competição, em termos hierárquicos, do calendário do futebol português. Tanta vez que critiquei ao longo dos últimos anos o desinteresse do público afecto ao Benfica por jogos oficiais, mesmo que da Taça da Liga, que devo mesmo elogiar a composta plateia do Estádio da Luz nesta 4ª feira. E uma palavra também para os muitos adeptos do Vitória que conseguiram estar a apoiar a sua equipa a meio da semana às 19h tão longe da sua cidade. Grandes.
O jogo despertava interesse por colocar frente a frente duas equipas já bem rodadas esta época, com compromissos europeus, e com promessa de bom futebol.
Já se sabe que nesta prova os treinadores acabam por mudar bastante o desenho e os nomes das suas equipas e, por isso, dificilmente temos ideias tão organizadas e articuladas como no campeonato.
A verdade é que foi a equipa de Ivo Vieira, que se confirma como um treinador muito interessante, a mostrar mais qualidade colectiva e com futebol mais convincente. Numa espécie de 4-2-3-1, o Vitória apresentou algumas caras novas. Douglas na baliza, Sacko na direita, Florent na esquerda, Pedro Henrique e Frederico Venâncio como centrais. Depois Agu e Denis como médios mais baixos, Davidson, André Almeida e Rochinha no apoio a Léo Bonatini. Uma boa ideia com lances promissores e que só não deram vantagem aos minhotos porque esbarraram numa bela estreia de Zlobin com alguma infelicidade à mistura.
Já Bruno Lage lançou Zlobin, a melhor revelação da noite, Jardel ao lado de Ruben, Tomás e Nuno Tavares nas alas. Samaris regressou ao meio, Gedson estreou-se como titular esta época, Taarabt manteve a posição e Caio como extremo. Na frente, Seferovic novamente a titular com a companhia de Jota, eles que inventaram o golo da vitória em Moreira de Cónegos. Houve muitos problemas para ligar o jogo e para conseguir que Adel, Jota ou Gedson fizessem a diferença no jogo interior. Ideias que foram bem contrariadas pelo posicionamento do Vitória.
Um 0-0 inquietante e que foi enervando a plateia da Luz habituada a festejar golos.
Na 2ª parte houve mais Benfica. Tomás Tavares soltou-se e apareceu bem ofensivamente, Gedson e Taarabt assumiram mais jogo mas não foi o suficiente para fazer a diferença na finalização.
Samaris acabou substituído e mostrou um momento de forma pouco interessante, Caio e Jota também não conseguiram agarrar a oportunidade e deram lugar a Rafa e RDT. Para o lugar de Samaris entrou Gabriel, a melhor notícia do dia.
Com estes três reforços, o Benfica ganhou dinamismo, mais objectividade, velocidade e impôs o seu futebol mais habitual.
Mas não chegou. Mesmo porque do outro lado foram a jogo Lucas Evangelista, André Pereira e Marcus Edwards, tudo jogadores de boa qualidade.
O Benfica foi mais forte depois das trocas e mostrou querer ganhar o jogo, esteve perto de conseguir fazer golo em duas ou três oportunidades mas acabou mesmo a zero.
Os quase 40 mil que foram à Luz deram o sinal que querem ver o Benfica ganhar esta competição, cabe agora à equipa lutar pelo apuramento em Setúbal e na Covilhã.
O grande dilema é o seguinte: o discurso de retoma europeia não bate certo com os zero pontos no final do dia depois da estreia europeia.
O Benfica começou a disputar a fase de grupos da Champions League pelo 10º ano seguido e não há maneira de sentirmos que a equipa dá o necessário salto qualitativo para bater certo com a promessa de pensar em grande na Europa.
As campanhas todas acumuladas adensam mais o sabor amargo de uma derrota caseira no arranque de mais uma campanha na Liga dos Campeões.
Nas últimas décadas o Benfica chegou aos 1/4 de final com o Bayern e com o Chelsea. Depois é preciso recuar a Koeman e lembrar o Liverpool. Foram as excepções que nos fizeram sonhar e que nos mostraram que podia acontecer um Benfica mais ambicioso na Liga dos Campeões. Mas por diferentes razões, o sonho de chegar mais alto vem sendo sempre adiado. Verdade que as duas caminhas até às finais da Liga Europa atenuaram bastante a frustração europeia mas não serviram de alavanca para mais e melhor.
Parece que há um medo cénico do Benfica em tentar regressar ao mais alto patamar europeu. Os adeptos não levam a sério as noites europeias na Luz que apresenta sempre uma triste moldura humana entre os 16 estádios que desfilam nos resumos no final da noite, e, há que dizê-lo, depois outros compensam com prestações vocais memoráveis longe de Portugal agarrando a ideia que há que ter euro ambição. Os vários treinadores do Benfica vacilam entre usar o 11 mais forte e consolidado e tentar lançar novas caras para não comprometer os pontos na liga portuguesa. Liga essa que é outro problema para o Benfica. O nível é tão mais baixo do que qualquer campeonato do top 5 europeu que os treinadores ficam sempre tentados a mudar algo táctico, individual ou colectivo para improvisar e surpreender o adversário. Isto porque fica demasiado fácil para qualquer clube que tenha de defrontar o Benfica vir observar a prestação interna da equipa e perceber como se joga. São cerca de 30 jogos internos que o Benfica tem para contornar adversários a jogar quase sempre da mesma maneira.
É isto em traços gerais.
Vamos ao desafio de hoje. Bruno Lage mexeu na equipa e no plano de jogo. Parece-me óbvio que o faça. Seguir para este jogo com o habitual 4-4-2 seria tornar tudo ainda mais previsível para o adversário. Já com o Frankfurt se percebeu que houve uma preocupação de montar um ataque diferente sem dar nenhum jogador à marcação da linha defensiva.
Hoje, Lage apostou em RDT mais à frente e Jota atrás, Cervi, uma surpresa mas que já tinha jogado no tal jogo com o Eintracht e Pizzi nas alas. Entregou o meio a Fejsa e Taarabt, dando continuidade a aposta do último jogo. Atrás também uma novidade, Tomás Tavares. André Almeida não estará ainda capaz de jogar dois jogos com um tempo de recuperação tão curto. Aqui parece mais uma necessidade do que um risco, mesmo porque Tomás Tavares fez uma exibição muito prometedora.
Portanto, a novidade era Jota a atacar as entrelinhas e Cervi mais fresco, primeiro jogo da época, para atacar e defender com a mesma velocidade e intensidade.
Curiosamente, de todas estas apostas a maior desilusão foi Pizzi. Mais uma vez em contexto europeu Pizzi parece eclipsar-se e até hesitar na hora do remate. É estranho o rendimento de um dos melhores jogadores do campeonato variar tanto em noites europeias. O valor de Pizzi quase que o obriga a estar no banco mas depois do jogo acho que até o próprio concordaria que teria sido melhor ter ido a jogo Rafa de inicio. São daquelas conclusões fáceis de tirar depois do jogo, antes é mais complicado.
Com tudo isto, o Benfica conseguiu dividir o jogo. Conseguiu mostrar momentos de bom futebol, especialmente guiados por Adel Taarabt e com combinações de primeiro toque que chegaram a empolgar a Luz.
A verdade é que o Benfica construiu oportunidades suficientes para marcar e isso é um bom indicador. O mais dramático é que continua a ser mortal a este nível não se concretizar as boas oportunidades. Grimaldo de livre viu Gulacsi a negar o golo, RDT arrancou grande remate mas voltou a sair ao lado, Pizzi foi irreconhecível na finalização e Cervi ainda devia estar a pedir desculpa pela envergonhada maneira como não marcou golo depois de um passe magistral de Taarabt.
Acrescenta-se a esta falta de qualidade na hora de fazer golo dois argumentos pesados. O primeiro é a diferença na hora de decisão de Timo Werner para a realidade que conhecemos. O alemão em oportunidade e meia faz dois golos. É duro mas é mesmo assim.
O segundo argumento é que há uns meses atrás quando batemos o Eintracht na Luz quem fez de avançado foi João Félix. Podem gostar muito ou pouco mas o rapaz é um craque e fez 3 golos resolvendo uma questão que hoje nem RDT, nem Jota conseguiram. E não conseguiram porque João Félix só há um de tempos a tempos e por isso é que saiu pelo valor que se sabe.
Então porque é que não se foi buscar um jogador assim? Bom, por mim trazia-se o Timo Werner, por exemplo. O problema é que só o dinheiro não chega para ter um jogador daqueles no nosso quadro competitivo e foi isso que Bruno Lage explicou na conferencia de imprensa antes do jogo com o Gil Vicente.
É neste drama que vivemos.
Houve coisas boas mas no fim da noite lá está o último lugar do grupo à nossa espera.
Há jogadores importantes de fora por lesão e há uma pressão extra pela nuvem negra que tem pairado sobre as prestações do clube na prova. Só um bom resultado na Rússia e um positivo confronto duplo e directo com o Lyon pode devolver a esperança europeia aos adeptos. Há condições para isso desde que a objectividade na hora de concretizar suba aos níveis desejados.
Quando em Maio fechei a temporada com uma crónica de campeão, depois de uma goleada por 4-,1 nem sabia com quem íamos abrir a época 2019/20. Tão pouco, esperava regressar à escrita para voltar a falar de uma goleada. Mas a verdade é que o mundo avançou após a conquista do quinto título em seis épocas, entrou o verão e o Benfica já começou a dar trabalho a quem organiza o espaço do Museu Cosme Damião. Entrou a Taça Hospital da Luz ganha em Coimbra e vai caminho o troféu do prestigiado torneio International Champions Cup , assim como a oitava Supertaça da história do clube.
Toda esta dinâmica contrasta com o barulho e o ruído que os tolinhos, que são pagos para agitar o defeso nos meios de comunicação deste país, fazem de forma absurda diariamente sem pausas e que agitam os (ainda mais) tolinhos que alimentam o circo vendo, ouvindo, discutindo e repetindo argumentos de uma realidade paralela.
No fim do dia temos o Benfica a abrir a nova época de taça na mão com uma exibição categórica, com um resultado de mão cheia (literalmente) e a festejar em harmonia com aqueles que realmente se dão ao trabalho de os acompanhar de Agosto a Maio, de sul a norte.
Tudo isto seria já suficiente para se perceber que o Benfica continua insaciável na hora de somar troféus mas tudo se torna mais especial se pensarmos que o adversário escolhido. numa cimeira maior de anti benfiquismo, para vir dificultar e mostrar ao mundo que todas as debilidades apontadas ao Campeão Nacional, pelos tais tolinhos, são verdadeiras, foi o rival da cidade de Lisboa. Pois, o Sporting chegou ao Algarve como sempre chega a todos os derbys, de peito feito e favorito nas suas convicções.
Esta é a grande diferença ente Benfica e Sporting actualmente. Não, nem me refiro aos 5-0. Refiro-me à preparação na pré época até aqui.
O Benfica tratou de planear um regresso ao trabalho pensando em todos os pormenores. A inevitável saída de João Félix e a chegada de Raul de Tomas, o adeus emocionante e emocionado a Jonas com um jogo na Luz que serviu de pretexto para os adeptos dizerem adeus ao lendário brasileiro, mais do que ver algum progresso na equipa que tinha acabado de voltar ao trabalho, o adeus repentino a Salvio, que já marca feliz no grande Boca Juniors, e um rápido partir para a nova realidade com novos objectivos. Uma digressão aos Estados Unidos da América que foi exemplar em termos sociais, hierárquicos e, acima de tudo, desportivos, que acabou com a espectacular conquista do torneio mais mediático de verão no mundo do futebol. Um regresso pensado ao pormenor para que as rotinas voltassem com normalidade e a preocupação de tudo estar bem para o primeiro jogo oficial da época.
Do outro lado, o Sporting limitou-se a passar a pré época a pensar no jogo da Supertaça. Um derby com o Benfica é caso de vida ou morte para aqueles lados. A obsessão de vencer o Benfica é mais forte do que pensar num futuro a médio prazo. Preparar a equipa para as quatro ou cinco dezenas de jogos que vão ter até Maio foi secundário. O que interessava era manter Bruno Fernandes até ao jogo do Algarve e vencer.
São duas maneiras diferentes de estar e de pensar. A diferença é gigante.
Em Portugal, actualmente, temos duas forças vaidosas a tomar conta do futebol. A Liga Portugal e a Federação Portuguesa de Futebol.
Quando se joga a Final Four da Taça da Liga, em Braga, entramos numa dimensão diferente da nossa realidade. Tudo é tão lindo, tanto fair play, tanta exposição mediática, tão bonito que é o futebol, os pormenores e detalhes à volta de cada um dos três jogos que definem um (absurdo) título de campeão de inverno. São uns dias de auto promoção da Liga de Pedro Proença que tenta fazer esquecer as condições miseráveis com que os adeptos do futebol que andam atrás dos seus clubes precisam de lidar durante toda época.
A FPF não quer ficar atrás e monta o seu show à volta da final da Taça de Portugal e na Supertaça. A ideia é exactamente a mesma da Liga Portugal, auto promoção, sinais exteriores de riqueza, agora reforçados com a entrada do Canal 11, e a montagem de uma feira à volta de um simples jogo que ultrapassa os limites do compreensível.
Falemos de termos práticos, daquilo que nem a Liga, nem a FPF, estão muitos interessadas em discutir. Falemos então dos adeptos que se dão ao trabalho de ir até ao Estádio do Algarve ver o jogo. Adeptos, esse conceito tão vago e que tantas chatices dão com as suas criticas e opiniões.
O jogo estava marcado para as 20h45. A essa hora o que víamos nós, chatos adeptos, dos nossos lugares no estádio? Víamos uma espécie de concerto num pequeno palco junto da bancada central com os Expensive Soul a cantarem, deduzo eu porque não consegui ouvir nada, um grupo de pessoas demasiado excitadas em frente ao palco e um relvado invadido por um coro Gospel, uma banda filarmónica (?) e os dois emblemas expostos no relvado. Os minutos passavam, olhávamos para os ecrans e lá víamos os protagonistas do jogo em enorme compasso de espera enquanto nos perguntávamos na bancada o que se estava ali a passar?
Jogo atrasado por um espectáculo sem sentido, sem contexto e que, talvez, tenha resultado em termos de televisão. No estádio foi um estorvo.
E o que é que revolta nisto tudo? Eu nada tenho contra espectáculos de bandas portuguesas ao vivo, antes pelo contrário, a minha vida profissional vive muito disso, como bem sabem aqueles que melhor me conhecem. Mas numa altura em que estamos no auge dos Festivais de verão, em que semanalmente tenho que estar presente em diversos concertos, nunca vi nenhum show atrasar para ver futebol antes. Ou seja, cada coisa no seu lugar. Sendo que isto não é o mais importante, é só uma nota de rodapé e subjectiva.
A minha grande questão para a Federação Portuguesa de Futebol é a seguinte: como é que explicam aos adeptos, os tais chatos do costume, que haja tanta verba disponível para se montar fans zones, palcos musicais, coreografias vistosas e por aí fora, e não haja um orçamento para limparem as cadeiras do Estádio antes do jogo!
Perguntem aos adeptos, os que pagaram para ali estar, em que estado ficaram as roupas usadas nesta bela noite de verão no Algarve. Calças e calções que passaram de ganga azul para branca com a brutalidade de sujidade com que estavam as cadeiras. Vergonhoso! E os bares do estádio? E aqueles topos eternamente provisórios que fazem com que uma carteira ou telemóvel caído acidentalmente das calças sujas vá parar ao abismo negro que é o labirinto de andaimes que suporta a bancada? E aqueles acessos de trânsito? Sem opções de transportes para o estádio, o que podemos dizer do caos que é tentar sair dos parques do estádio com esperas de duas horas após um jogo que devia começar às 20h45 mas que, como já vimos, começou e acabou bem depois da hora prevista. E sem prolongamento nem penaltis.
Desculpem lá o desabafo mas é que ainda há adeptos que se sacrificam pelos seus clubes mesmo sabendo que são o menos importante dentro desta feira de vaidades em que se transformou o futebol português. O que interessa é que chegámos todos com saúde a casa, uns de madrugada outros já com o dia a nascer.
Quanto ao jogo, só posso falar de uma vitória normal do Benfica. Pode soar a presunção mas é a verdade. Desde que Bruno Lage tomou conta da equipa, os derbys têm sido entretidos.
Em Alvalade para o campeonato o Benfica venceu por 2-4. Teve golos anulados, falhou outros tantos e, mesmo assim, no dia seguinte houve quem dissesse que não foi goleada nenhuma e que não houve uma superioridade assim tão grande. Depois, na Luz para a Taça de Portugal, o Benfica chegou ao 2-0 e quando se esperava o 3-0, o Sporting teve uma oportunidade e fez o 2-1. Passámos de mais um passeio num derby para um resultado perigoso que depois se transformou numa inesperada derrota que nos afastou do Jamor. Mas, na verdade, nos três derbys jogados, o Benfica andou sempre muito mais perto de golear do que acabar a perder.
Agora, na Supertaça voltou a ser evidente a superioridade do Benfica. Antes do jogo, Bruno Lage disse como ia jogar o Sporting. Acertou e por isso já estava um passo à frente em relação ao rival. Preparou a equipa, mesmo improvisando Nuno Tavares na direita, que foi bem testado e rodado ali na pré época, e lançou RDT como novidade no onze. Alta pressão, fecho do corredor central obrigando o Sporting a jogar por fora, Rafa e Pizzi a fecharem, Florentino a cobrir as subidas por fora a partir do corredor central, Gabriel a recuperar bolas e Raul de Tomas a recuar e a ser decisivo no equilíbrio defensivo.
Foram estas as chaves decisivas para uma noite tranquila do Benfica. A associação entre Pizzi e Rafa é letal e quando uma equipa é preparada no seu todo, colectivamente, com plano de jogo flexível e ainda com recurso a um banco de nível elevado, o resultado acaba por aparecer. Estar agarrado a um só jogador e preparar uma Supertaça como se o mundo acabasse a seguir não podia ter um bom fim.
A goleada por 5-0 é histórica mas é mais saborosa por ter acontecido de uma maneira tão natural como aconteceu aquele 2-4 em Alvalade. Ou aquele 2-0 na Taça que esteve quase, quase a ser alargado e acabou por ficar 2-1 porque o futebol também é aquilo.
A trabalhar como se trabalha no Benfica, o normal é termos mais noites destas do que o contrário. Reparem que, praticamente, metade dos jogos oficiais que Bruno Lage leva à frente do Benfica acabaram com goleadas. Não deve ser por acaso...
De tudo isto resulta uma imensa e enorme vontade de começarmos o campeonato. Que esta ambição nunca acabe. Ao Benfica o que é do Benfica.