Benfica 6 - 0 Marítimo: A Realidade dos 90%
Conclui-se desta eliminatória da Taça de Portugal que, actualmente, há três realidades distintas no futebol português que importa abordar.
A primeira realidade diz-nos que o Benfica nos últimos anos evolui estratégias, posturas e conceitos de jogo que lhe permitam ser líder. No Benfica, percebeu-se que o essencial é vencer os jogos que representam à volta de 90% do nosso calendário. É preciso não vacilar com os Marítmos da vida, com todo o respeito para o clube da Madeira e todos os outros. É preciso jogar mais e de forma convincente naqueles jogos que acabam por ser a maioria da nossa vida. De que vale jogar muito bem um derby se depois não ganhamos aos Tondelas? O que interessa eliminar um rival numa competição se depois não ultrapassamos o Chaves?
O foco tem de estar nos jogos típicos do nosso calendário. E nesses jogos o Benfica nos últimos anos tem sido avassalador. Quando tudo sai bem podemos ter exibições de luxo como a de ontem. Quando as partidas ficam mais apertadas, há a alma e o querer chegar à vitória até ao último segundo. Uma coisa é certa, partimos sempre para estes jogos confiantes que a equipa vai determinada e sabe como ganhar.
Depois há a realidade dos clássicos e derbys. Nas últimas épocas o Benfica não tem sido feliz na maioria dos jogos com os rivais. Mas, também aqui, há uma explicação lógica. Pelo facto do Benfica despachar 90% do seu calendário sem tropeções, obriga que os adversários directos tenham de dar tudo por tudo nos confrontos directos. E não custa admitir que algumas vezes vimos as equipas rivais a jogar mais e melhor que o Benfica. O que faz toda a diferença é que na hora certa o Benfica reage sempre. A tal alma de campeão. Foi assim no derby que Mitroglou resolveu, foi assim há duas semanas quando Lisandro resgatou um ponto no Dragão. E isto deixa-os completamente doidos, a pensarem que o Benfica não joga nada e só é feliz por sorte. Esquecem-se é que durante 90% da época, o Benfica não falha. Joga, marca, ganha e até dá show de gala como este 6-0 documenta.
O Benfica em vez de concentrar todas as suas forças em clássicos e derbys, deixa que sejam os adversários a fazer desses jogos os desafios da época e dão tudo por uma vitória e uma boa exibição. O Benfica prefere dar tudo sempre em todos os jogos, isto é que faz a diferença. Por isto, é que no final desta ronda houve quem caísse depois de ter feito a melhor exibição do ano e houve quem mostrasse alívio em ter dado revirado um jogo contra uns amadores com uma volta olímpica. Diferenças.
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A última realidade do nosso futebol é a da negação. As duas realidades que expus em cima são tão óbvias que só entrando numa realidade paralela se pode combatê-las. Felizmente, estamos rodeados de índios e cowboys de enorme imaginação e incansável vontade de baixar o nível e o respeito que se possa ter pelas instituições que representam.
Nesta realidade paralela há que destacar algo que parecia impossível de ver no nosso futebol. Responsáveis de um clube que dominou o futebol sob efeito de apito dourado a queixar-se de... arbitragens. Mesmo que nem razão tenham, não deixa de nos trazer um enorme sorriso e um sentimento de justiça poética. Pensei não ver isto nesta vida.
De outro lado temos o universo da loucura. O Benfica domina, como vimos, as competições onde entra por via de ter encontrado a fórmula certa para ganhar 90% dos seus jogos por época? A explicação é simples: árbitros comprados com vouchers que dão colinho, adversários que facilitam por obra e graça sabe-se lá do quê, e todos os agentes do futebol português, sem excepção, estão ao serviço do Benfica. Benfica que, nesta realidade paralela, passou a ser carnide ou venfique ou, na melhor das hipóteses, slb com emblema mais pequeno nas transmissões da Sporting TV do andebol, por exemplo.
Esta realidade paralela é a mais cómica mas também a mais aborrecida. É que já são muitos anos deste circo, todos os dias com novos episódios, e depois vem o Benfica para um jogo da Taça e dá um recital de bola como este da Luz contra o Marítimo e todos os imbecis que argumentam idiotices em modelo de carneirada ficam a olhar para as exibições do Nélson, do Pizzi, do Guedes, do Cervi, dos golos do Mitroglou e do Raul e ficam a pensar o tão idiotas que conseguem ser.
Felizmente, passa-lhes depressa e voltam à carga com mais imaginação.
Enquanto isto, os benfiquistas aproveitam para apreciar e viver esta realidade dos 90% que há tantos anos procuravam e que agora sabe tão bem vivê-la.
Voltando aquela ideia da bela da monotonia que apresentei depois do jogo com o Paços de Ferreira, noites destas deviam representar 90% da minha vida. Mudar aos 3 e acabar aos 6 era o que eu decretava nas regras FIFA para jogos do Benfica.
Tão bom saber que ainda temos tantos jogos para usufruir e apreciar o futebol desta equipa.
E ver o circo a pegar fogo.