Amigos Coloridos
Há exemplos tristes de como se pode andar para trás em termos de mentalidade em vez de evoluirmos. As cores dos clubes de futebol sempre foram uma das questões mais básicas em discussões, provocações, opções e brincadeiras entre adeptos.
Quem nunca optou em criança por um objecto usando o critério da cor?
- Oh mãe quero um daqueles rebuçados.
- Está bem, toma este. Só um que o açúcar faz mal.
- Mãe, este não!
- Então porquê?
- É verde/azul. Quero o vermelho.
Todos já passámos por isto dando preferência às cores do nosso clube. E Isto é replicado em todas as infâncias. Não ofende ninguém.
Quando comecei a ver futebol achava piada a um pormenor na camisola do Porto, os números nas costas eram vermelhos. Nunca os vi incomodados com isso e brincava-se dizendo que levavam o Benfica às costas. Também me lembro de ver um avançado a brilhar na Antas com o nome de ... Vermelhinho.
Dava para brincar, mesmo porque no Benfica também me habituei a ver o grande capitão, e a minha maior referência no clube, Manuel Bento a equipar de verde. Também usava muito o azul. E ficava-lhe bem. Sem problemas nem complexos. E havia piadas dos rivais, claro que havia. Mas incomodavam zero.
Na nossa gloriosa história há imagens de conquistas de taças que estão ao alcance de qualquer pessoa numa rápida pesquisa no google. O grande goleador Nené levantou uma Taça de Portugal no Jamor com a camisola do Porto vestida.
O gigante dinamarquês Michael Manniche aparece numa fotografia de vencedores no Jamor equipado à Porto. O Manuel Fernandes após um derby na Taça Guadiana trocou de camisola com o amigo Miguel Veloso e deixou-se fotografar com ela vestida na entrega de prémios.
Não consta que nenhuma das fotografias tenha sido alvo das novas tecnologias, ninguém usou o Photoshop para apagar aquilo que hoje em dia parece uma ousadia. Aceitamos sem complexos de inferioridade.
Até já jogámos com uma equipamento alternativo que ficou conhecido por azul à Benfica e ninguém morreu.
Hoje rimos disso.
Nos guarda redes do Benfica de vez em quando vem a discussão porque os guarda redes jogam de verde ou azul. Não tem discussão, até faz parte da nossa história como já aqui expliquei.
Um dado novo é a cor das chuteiras dos jogadores. Nos últimos anos abandonou-se o preto e cada marca passou a ter uma palete de cores à disposição dos craques. Irrita um bocado ver jogadores do Benfica com verde ou azul nos pés mas é apenas um pormenor, tal como era o vermelho nos números das camisolas do Porto. É uma questão de bom senso, não é um caso de polícia que mereça regras em contratos.
Nunca vi no meu clube nenhum jogador ser castigado ou multado por usar verde ou azul nos pés, na cabeça, nos pulsos ou na baliza. Nem por ter trocado de camisola com um rival e vesti-la.
Era o que faltava. O Benfica que teve eleições democráticas em tempos de ditadura, o Benfica que tinha a palavra Avante no seu hino em tempos de proibição, palavra bem recuperada pela bancada agora, o Benfica que passou ser identificado como os Encarnados por uma comunicação social sempre medrosa mas que exibiu sempre o vermelho onde brilha a luz intensa do sol que lá no céu risonho vem beijar com orgulho muito seu.
As cores para nós nunca foram um problema, antes pelo contrário, foram sempre um orgulho.
Isto contrasta com a mudança de mentalidades a norte e ali ao lado. Os nossos rivais foram consomando um ódio ao vermelho, ou encarnado, como preferirem, até ao nível do rídiculo.
O Benfica nem chega a esse problema porque se tivesse que banir a cor de um rival tinha logo um dilema; qual deles?! É que eles têm um alvo comum, nós não. Também por isso é que a diferença no apoio das bancadas é tão grande. Enquanto as claques de Sporting e Porto em momentos de euforia, longe de clássicos ou derbys, dedicam cânticos ofensivos ao rival comum, atrás do Benfica só se ouve apoio.
Nos últimos anos a cor vermelha tornou-se uma doença em Alvalade. O líder faz questão de legislar contra a cor do rival. Nem é preciso comentar mais nada.
Qualquer dia estão a embirrar com as cores da Selecção Nacional e a pedir para os seus jogadores não vestirem a camisola principal...
Ah, esperem! Afinal, um qualquer advogado sportinguista já deu o mote no Record.
Estamos conversados.