Um Dia Memorável em Marvila - Imagens
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(Fotos: João Trindade)
Eu já era nascido quando o Benfica visitou Marvila pela última vez. Foi há 40 anos, obviamente, não me lembro de nada. Há 12 anos vi o Oriental na Luz, treinado pelo nosso Chalana, num jogo para a Taça de Portugal, ainda Bruno Aguiar jogava pelo Benfica. Desse já me lembro bem, o Benfica ganhou com tranquilidade, 3-1 com bis de Sokota, mas a exibição não entusiasmou e até acabou com queixas dos homens do Oriental sobre a agressividade de Paulo Almeida.
Todas as épocas aguardo com grande expectativa os sorteios das taças internas na esperança que nos saia uma deslocação a um campo mítico. Penso sempre na Tapadinha e em Marvila. Desta vez saiu mesmo o Oriental e o responsável do clube quis manter o jogo em casa. Agradecemos esta oportunidade porque foi a prova que o futebol à antiga está vivo. Futebol a meio da tarde de um dia de trabalho num estádio velhinho e no inverno, resultado? Enchente! Imagens de pessoas em cima dos prédios, adeptos em cima de muros e de pé em todos os cantos das bancadas, a essência do futebol.
Almoço na Floresta Oriental em Marvila, boa comida por preços reduzidos e muita simpatia no atendimento. Depois, caminho a pé para o estádio subindo a mítica Azinhaga dos Alfinetes até ao Estádio Engº Carlos Salema. Sente-se que a história do futebol já passou por ali.
Como já tinha ali assistido ao derby Oriental - Atlético na época passada sabia onde queria ficar. A curva entre a central e o topo dos adeptos visitantes onde há um passeio em pedra com uns muros onde nos podemos encostar. O Benfica regressava às origens do futebol, a emoção fora de campo é muito maior do que lá dentro. Gerações mais novas nunca pensaram ver o Benfica jogar num estádio tão humilde, o olhar era constantemente desviado para os telhados dos prédios cheios de adeptos, para o bar atrás das bancadas que esteve sempre concorrido e para o horizonte atrás da baliza sem bancada onde se vislumbrava o bonito Rio Tejo como cenário.
O jogo não foi nada de especial, aliás não se esperava um grande espectáculo. Por norma, esta fase da competição não oferece jogos memoráveis em termos de qualidade de jogo. O objectivo é rodar a equipa e vencer. A festa fez-se de fora para dentro.
Das escolhas de Rui Vitória o maior destaque vai para a ausência de Grimaldo, talvez a maior desilusão da tarde devido à enorme expectativa que há em volta do espanhol. Jogou Sílvio com a braçadeira de capitão.
Aproveitaram bem esta oportunidade Ederson, Talisca e Lindelof. Especialmente estes.
O guarde redes brasileiro foi mesmo a figura do jogo ao negar por duas ou três vezes o golo do Oriental, novamente decisivo tal como tinha acontecido na primeira jornada da competição com o Nacional.
Talisca fica sempre ligado ao jogo por ter marcado o golo da vitória e ainda atirou uma bola à trave.Confirma-se que o baiano tem golo.
O defesa sueco cumpriu na perfeição o papel de substituir Jardel, e isto já é dizer muito da sua exibição.
Depois, Djuricic tentou mostrar serviço sem ser muito convincente, Samaris cumpriu no meio campo e Gonçalo Guedes voltou à titularidade sem grande sorte. Nelson Semedo regressou mas ainda longe da forma com que se apresentou na Selecção.
As entradas de Pizzi, Jimenez e Renato deram frescura e novas ideias ao ataque do Benfica que acabou por chegar ao golo à entrada do último quarto de hora do jogo.
A vitória é natural mas o Oriental fez por merecer melhor resultado, sem dúvida.
O objectivo foi cumprido, o sonho de ir a Marvila ver o Benfica concretizou-se. Do jogo vai ficar na memória o golo e a exibição de Ederson mas aquilo que ficará mesmo para a história é a experiência vivida nas bancadas e à volta do campo.
Maravilhoso.
PS e o equipamento todo branco do Benfica na tarde de Marvila? Lindíssimo!
Um Oriental-Benfica, no Estádio Engenheiro Carlos Salema. Na foto, o orientalista Mário Luz disputa a bola com Coluna.
Esta é uma peça assinada pelo Filipe d'Avillez e publicada hoje no site da Rádio Renascença. Tive o prazer de ser um dos seus entrevistados e reproduzo aqui o trabalho à volta do Oriental. Chamo a atenção também para a edição da Bola Branca às 22h30 onde podem ouvir na rádio esta reportagem.
Chegamos ao Estádio Engenheiro Carlos Salema, onde esperamos encontrar o plantel do Clube Oriental de Lisboa a treinar. Mas não se ouvem gritos, nem ordens do treinador. O silêncio sepulcral apenas é interrompido pelo balir de ovelhas e cabras que pastam as ervas junto ao muro exterior, ignorando os prédios altos que rodeiam o campo.
Entrando, torna-se evidente a razão do silêncio. Os jogadores foram treinar para outro lado para tentar poupar o relvado. Devido às chuvadas, o campo está em mau estado. Há 40 anos que o clube de Marvila não joga na principal divisão do futebol profissional, mas os orientalistas ostentam um passado de grandeza e querem receber o bicampeão nacional com as melhores condições possíveis.
Com as melhores condições, mas que sejam as suas condições. Muitos esperavam que o jogo com o Benfica (terça-feira, a contar para a Taça da Liga) fosse transferido para um estádio com melhores condições para garantir maior encaixe financeiro. Mas o presidente do clube nem quer falar dessa possibilidade.
“O sorteio ditou que o jogo era aqui, o jogo é aqui! Não há mais que ver. Não faz sentido deslocarmo-nos daqui, daquilo que é o nosso meio ambiente, esta é a nossa casa, é aqui que gostamos de jogar, é aqui que nos sentimos bem e é aqui que vamos reviver, em certa medida, o passado”, diz.
José Fernando Nabais sabe do que fala. Conhece esse passado melhor que a maioria dos orientalistas. “Eu nasci no Oriental, praticamente. Nem na maternidade nasci, nasci na rua de Marvila. Vejo os jogos do Oriental desde que me conheço, tive a felicidade de ver o Oriental ascender à primeira divisão pela última vez em 1973.”
Este jogo com o Benfica não é, por isso, uma oportunidade única na vida para o Oriental jogar com um grande, é mesmo um “reviver do passado” e, espera o dirigente, uma “catapulta para o futuro”. Um futuro “que tem de ser melhor do que aquilo que tem sido, não haja dúvida nenhuma”.
Chelas, Marvilense, Fósforos
O presidente não é o único adepto do Oriental que tem memória de melhores dias. Diante da sede do clube encontramos dois amigos à frente de um quiosque, ambos sócios, que confirmam aquilo que nos tinham confidenciado alguns dos jogadores: os orientalistas são exigentes e não se poupam nas críticas ao plantel e aos atletas, sobretudo quando as coisas correm mal.
Há décadas que o Oriental não estava sequer na segunda liga, onde se encontra agora, mas há clubes que não foram feitos para ser pequenos.
“Ainda bem que somos exigentes, se não fôssemos exigentes já o Oriental tinha acabado”, diz um dos homens, que se identifica apenas como “Russo do Poço do Bispo”. Distingue entre os adeptos que vão ver os jogos mas não se importam que o Oriental perca e os verdadeiros orientalistas (“A que nós chamamos a quinta coluna”).
"Russo": "Se não fôssemos exigentes já o Oriental tinha acabado"
Fala-se muito em bairrismo, mas a verdade é que o Oriental não nasceu com vocação de clube de bairro. Fruto de uma junção de três clubes, o Chelas, o Marvilense e o Fósforos, todos da zona leste da capital, a ideia era ter um clube capaz de ombrear com os maiores e que representasse toda a parte oriental de Lisboa. Daí o nome. O problema é que Lisboa cresceu muito desde 1946 e o clube não conseguiu acompanhar.
“A zona oriental de Lisboa, na altura, extinguia-se no início da freguesia dos Olivais. Hoje vai até ao Rio Trancão, com milhares de pessoas, que o Oriental deveria fidelizar. É um trabalho que estamos a fazer, mas que vai levar gerações”, diz o presidente.
O Oriental na época 1984/1985
Acredita que “o Oriental tem todas as possibilidades de crescer. Está numa zona densamente populacional, só pode crescer. É preciso é ter as políticas certas e crescer de forma sustentada”.
Joaquim Lopes, amigo de “Russo”, tem duas grandes queixas. “A malta nova que é do Oriental é toda do Benfica, do Sporting e do Porto”, diz. “A gente ia ver o Oriental porquê? Porque jogava lá o primo deste, o primo daquele e o primo do outro. Hoje não. Hoje vamos ver o Oriental e vê-se lá um argentino, dois brasileiros, que nem conhecemos de lado nenhum.”
O futebol é do povo
Já dentro da sede do Oriental forma-se fila para comprar os bilhetes que começam a ser vendidos para o jogo com o Benfica. Enquanto esperam por Maria João – que na qualidade de secretária também trata da bilhética – trocam-se impressões sobre o estado do clube. O consenso é que a descida de divisão será desastrosa e há quem não compreenda que se tenha perdido a oportunidade de encaixar mais dinheiro com a mudança do campo.
Curiosamente, entre os adeptos do Benfica, que habituados a estádios com melhores condições mais naturalmente lamentariam as do Engenheiro Carlos Salema, encontramos quem aplauda efusivamente a decisão da direcção do Oriental.
Não se trata de clubismos, mas de um apreço pela cultura futebolística, explica João Gonçalves, autor do blogue Redpass e comentador da Benfica TV. “Um estádio de futebol antigo, com muita história, é um espaço quase de peregrinação do adepto de futebol e que contrasta completamente com os estádios modernaços, que são precisos também para os grandes espectáculos, mas o futebol não pode viver só disso.”
“O futebol sempre foi do povo e sempre que uma equipa de dimensão menor, mas com grande historial e que ainda tem o campo original, tenta fugir do seu local para gerar um encaixe financeiro maior, seja pela transmissão televisiva, seja por via de maior venda de bilhetes, é errado”, diz.
João Gonçalves não tem idade para se lembrar de ter visto o Benfica a jogar em Marvila, mas recorda do seu avô os relatos da reputação aguerrida dos adeptos locais. Memórias confirmadas por António Correia Rodrigues, com quem falamos à mesa do restaurante A Concha. Estamos em Marvila, à volta de uma dose de cozido. “Era um clube, bairrista, como se costuma dizer, e até o campo tinha uma fama... Chamavam-lhe o Monte dos Vendavais”, diz o sócio, de 84 anos, que era do Marvilense antes da fusão.
“Recordo-me do Portimonense vir aqui, trazia umas dezenas de rapazes que pertenciam à Armada, ou lá o que era aquilo, e vinham de Portimão para aqui já preparados para a guerra. Mas o Oriental tinha rapazes que eram bons nisso. Havia uma equipa de 13 aí que eram fora de série.”
Os jogos mais intensos nem eram contra os grandes, garante o sócio. “Os jogos bons do Oriental era o Oriental-Montijo, o Oriental-Barreirense. Íamos ao Montijo e iam sempre parar gajos dentro de água. O Oriental levava sempre mais gente aos campos fora do que o adversário traz aqui”, recorda. “O Oriental nunca tratou mal ninguém, nunca tratou mal ninguém!”
Nunca tratar mal ninguém é talvez um ligeiro exagero, a julgar pela história que se segue quase de imediato, sobre um árbitro que num jogo de juniores terá prejudicado o clube local. “Ele trabalhava aqui na Companhia de Gás e Electricidade e o Oriental não ganhou ao Benfica porque ele inventou coisas. Passados dois dias foi ele, foi mota, foi tudo para a doca. Foi tudo parar lá dentro.”
... Mesmo bom é ver que a loucura não tem fim nem tem controlo possível.
Óptimas notícias.
Subitamente, de véspera, a curta deslocação ao Estoril tornou-se, ainda mais, determinante. Começar a 2ª volta do campeonato com um encosto ao líder era mais uma motivação para encher o Estádio António Coimbra da Mota.
Como já é costume nestas situações, tudo se torna pequeno e incompetente para receber a grandeza do Benfica, especialmente fora do relvado. Tal como em Belém, tal como no Bonfim, ainda há poucas semanas, e tal como em tantos outros campos, os benfiquistas têm que passar um enorme tormento até conseguirem chegar ao lugar no estádio para o qual compram bilhete.
Não é aceitável ir para um estádio com o propósito de ver o Benfica e ficar privado de acompanhar os primeiros 15 ou 20 minutos por incompetência de quem gere e organiza a competição.
Chegar a casa e ir ver metade da primeira parte para ficar com a visualização do jogo completa não é fácil de gerir:
"Então, o que é que foste lá fazer se vens para casa saber como foi o golo do Estoril?"
Pois, não dá para explicar.
O Benfica entrou com a mesma equipa pela terceira vez seguida. Opção lógica de Rui Vitória para dar continuação aos últimos bons resultados. Apesar da entrada correcta em jogo, desde cedo em busca do golo, a finalização não estava afinada, uma bola no poste e outras ao lado, e na primeira resposta do Estoril o Benfica sofre um golo e fica, estranhamente, a perder. Erros de Eliseu a não fechar o seu flanco como devia e erros de marcação de Jardel, posicionalmente mal, e de Lisandro que deixou escapar Leo Bonatini. O avançado do Estoril continua a mostrar qualidade, é um jogador bem interessante.
Tendo em conta que esta época o Benfica sempre que se viu a perder não conseguiu virar o resultado a seu favor fora da Luz, houve alguma apreensão na bancada. Mas também considerar este jogo como sendo em terreno adversário é capaz de ser um exagero devido ao incrível apoio vermelho e branco que se sentia em quase todo o estádio.
A verdade é que até ao intervalo o Benfica não convencia na maneira como atacava a baliza. Raul Jimenez exemplificou como não se deve fazer quando se tem uma óptima oportunidade para marcar, isolado dominou a bola e não conseguiu bater Kieszek. Era por ali que se tinha de modificar e Rui Vitória ao intervalo não hesitou em trocar o mexicano por Mitroglou.
A substituição revelou-se determinante na forma como o Benfica passou a atacar. Mais presença na área adversária, Jonas mais solto, Pizzi e Carcela mais eficazes a cruzar desde as alas e até Renato Sanches a aparecer com mais acerto em zonas avançadas, tal como Fejsa que fez mais um enorme jogo.
O futebol tem nuances engraçadas. No jogo da 1ª volta na Luz, o Estoril jogou muito bem, teve mais bola, atacou com mais perigo e aguentou um empate até perto do final. Depois deitou tudo a perder em pouco mais de dez minutos e saiu goleado. Mas deixou uma boa imagem.
Agora, até esteve a ganhar durante muito tempo. Mas não queria ter bola, não procurou atacar e também não soube defender concentrado muito tempo. Quando o Benfica carregou com mais intensidade, sempre apoiado pelos adeptos incansáveis, o empate apareceu de maneira natural. Mitroglou na área a justificar a sua entrada. Estavam jogados 52' e ninguém no estádio duvidou que havia tempo suficiente para a primeira reviravolta da época fora de casa.
Aos 65' acontece polémica, Diego Carlos alivia uma bola que Kieszek não apanha, Pizzi toca na bola perdida de costas e ficamos todos com a ideia que o guarda redes do Estoril emenda já com a bola dentro da baliza. Grita-se golo em vão. Durante segundos fica o receio; e se não voltamos a meter a bola lá dentro?
Não foi preciso esperar muito, Pizzi finaliza grande jogada após assistência de Jonas e faz mesmo o 1-2. Acto contínuo segue em corrida para a bancada que puxou o Benfica para os golos e comemora com os adeptos. Tem sido uma imagem de marca nesta época. E que excelente imagem!
Consumada a reviravolta pedia-se que o Benfica procurasse o golo da tranquilidade e que impedisse o Estoril de voltar ao jogo. É verdade que houve mais duas ou três oportunidades mas a vantagem mínima não dava confiança a ninguém.
Pelo meio acontece mais um episódio curioso do futebol português, holofotes que se apagam. Nem é novo mas desta vez não fez mossa.
Aos 95' Júlio César mostrou a importância de haver um guarda redes de qualidade superior numa equipa campeã, um canto de Mattheus que Mano desvia para uma enorme defesa do brasileiro que segurou assim os importantes três pontos.
Missão cumprida no inicio da segunda parte do campeonato. O título desta crónica foi visto pelas redes sociais no regresso do Estoril e reproduzido aqui à espera que alguém acuse os créditos.
Dois pedaços de conversa sábia do saudoso Bobby Robson.