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É este o cenário do nosso Estádio nesta tarde de dilúvio em Lisboa:
Se há 17 anos a seguir ao jogo de Parma me dissessem que só voltaria a ver o Benfica nas meias finais de uma prova da UEFA ontem eu ficaria chocado.
Se há 17 anos me dissessem que quando voltássemos às meias finais europeias seria contra uma equipa portuguesa eu estranharia.
Há 17 anos o Braga na Europa limitava-se a aparições ocasionais que contavam sempre com a nossa simpatia torcendo para que fossem passando as primeiras fases.
Há 17 anos já eu tinha vivido na Luz cinco inesquecíveis noites de meias finais europeias. Contra o Karl Zeiss Jena da RDA ganhámos 1-0 e foi curto para o 0-2 sofrido na Alemanha de Leste. Contra o Universidade de Craiova empatámos a zero numa noite de pontaria desafinada, na Roménia empatámos a 1 e avançámos. Contra o Steua de Bucareste uma das melhores noites da minha vida com um 2-0 num ambiente absolutamente infernal depois do zero a zero da Roménia. Contra o Marselha o lendário golo de Vata a juntar ao 2-1 de França que fez explodir a Luz. Contra o Parma numa noite de ambiente fabuloso um resultado de 2-1 que soube a pouco depois de um penalti falhado por Paneira contra uma equipa que era na altura uma das mais fortes de Itália. Sensini matou-nos o sonho em Parma.
Se há 17 anos me dissessem que a próxima meia final da nossa história iria ser jogada contra o Braga eu ria-me.
Se há 17 anos me dissessem que no dia da próxima meia final eu ia acordar em Barcelona e que iria viajar para Lisboa perto da hora do jogo e chegaria à Luz mesmo a tempo de ver a partida eu iria duvidar.
O que é certo é que em 2011 tudo isto é uma realidade. E o que está a faltar agora para me sentir eufórico com esta jornada europeia? Está a faltar a paixão de há 17 anos. Não minha, porque essa está cá, falta a paixão de uma nação benfiquista que hoje é reduzida a estatísticas. Dantes não havia recordes do Guinness nem conversas de 6 milhões, havia uma moldura humana na Luz impressionante e imponente. As pessoas ocupavam as bancadas de pedra muitas horas antes do jogo. Não havia adeptos a entrar com o jogo a decorrer, porque quando as equipas apareciam para aquecer já o estádio estava quase lotado, não havia adeptos a virar costas à partida porque se acreditava até ao fim e o Benfica naqueles 90' para aquela gente era coisa mais importante do mundo. Não havia assobiadelas em fases de jogo difíceis, não havia assobiadelas individuais aos jogadores menos queridos do 3º anel porque havia o sentimento de responsabilidade e a noção da importância que era ter o estádio a empurrar a equipa.
Andámos 17 anos para regressar a uma noite assim, muitos dos leitores do Red Pass nem sabem o que é ver o Benfica numa meia final europeia. Infelizmente continuam sem saber porque ontem o que eu presenciei na Luz foi apenas e só mais um jogo de futebol de casa cheia e pouco mais. Não senti diferença em relação ao último encontro da Liga ou da Taça de Portugal contra o Braga em casa. Foi apenas e só mais um jogo importante. Não foi o grande momento de regresso a uma meia final europeia.
Para ter sido sido um momento digno de figurar na memória colectiva ao lado das outras meias finais que mencionei e das outras em que eu nem era nascido faltou explicar aos nossos rapazes a herança que o emblema, que eles carregam ao peito, tem. Mas teríamos também de explicar aos adeptos mais recentes do nosso clube a importância de uma noite destas.
Como se poderia fazer isso?! Nao é fácil mas avanço uma ideia baseada numa experiência pessoal recente.
Levem o nosso plantel , os nossos dirigentes, os nossos funcionários e já agora façam excursões para os nossos adeptos ao museu do FC Barcelona. Nem mais. Só precisam de ir a um espaço dentro do museu onde há uma enorme mesa multimédia interactiva onde estão em mosaico fotos de todas as finais que o colosso catalão já jogou. Num canto do lado esquerdo está uma foto do estádio de Berna e uma legenda que diz qualquer coisa como: A Final dos Postes!
Coloca lá o dedo e aparece uma janela maximizada com um vídeo onde se vê logo a equipa do Benfica alinhada com o lindo manto sagrado a preto e branco. O resultado foi uma vitória épica de 3-2 para o Benfica e a conquista da 1ª Taça dos Campeões Europeus. Na realidade tivemos sorte com algumas bolas do Barça a irem ao poste, mas a vitória foi incontestável. E desta maneira a meio da visita ao museu do Barça quando nos sentimos esmagados pela grandeza das conquistas daquele clube aparece ali um gigantesco momento de orgulho, nós vergámos aquele gigante a uma derrota histórica. Eu que estava com um pólo com o emblema glorioso ao peito senti um orgulho inexplicável, senti os olhos brilharem perante a história. Já fomos do tamanho do mundo e os nossos adeptos estavam lá ao lado da equipa. Adeptos como o meu falecido avô que viveu as páginas mais lindas da nossa história.
Era preciso que os homens que fazem o presente do nosso Benfica sentissem o peso da nossa história, soubessem o que significa estar numa meia final europeia. Era preciso que os homens que hoje frequentam as confortáveis cadeiras da Luz soubessem como era o ambiente das noites europeias até há 17 anos.
Com isto não quero dizer que o Benfica ontem tenha feito um mau jogo. O que me deixa triste é isto. O Benfica não fez um mau jogo, procurou ganhar, tentou fazer mais golos, tentou contrariar a pressão a todo o campo do Braga e apesar de andarmos a gerir o plantel há mais de um mês apresentámos uma equipa remendada para o jogo europeu mais importante dos últimos 17 anos. Ganhámos o jogo mas sofremos um golo, acertámos nos postes mas só fizemos dois golos. Ou seja repetimos o resultado de há 17 anos só que do outro lado em vez do Parma de Bucci, Sensini, Brolin, Zola ou Asprilla estava o ... Braga. Não sei em que altura da nossa história é que baixamos as expectativas ao ponto de acharmos positivo vencer por 2-1 o Braga numa meia final europeia. É que eu lembro-me da frustração que sentimos com o mesmo resultado contra a equipa italiana na altura. Mas também estávamos noutro tempo... Era o tempo que as noites europeias eram apenas e só às 4ªs feiras às 21h, era o tempo em que na Luz estavam 120 mil pessoas a empurrar a equipa, era o tempo em que o apoio era incondicional mas também era o tempo que acabado o jogo havia muita gente a ficar nas bancadas e a surpreender o sueco Brolin com uma ovação enorme na altura em que os italianos regressaram ao relvado para uma corrida de descompressão, coisa rara de se ver na altura, e o 3º anel mostrou o quanto apreciava bom futebol aplaudindo o génio sueco que ficou surpreendido. Nada de sair mais cedo ou chegar mais tarde, era uma altura que a noite europeia era para absorver na sua totalidade.
Ganhámos 2-1, diz-nos a estatistica que nesta época europeia este resultado tem servido para seguirmos em frente, foi assim em França e na Alemanha, espero que seja assim em Braga. Não me passa pela cabeça que se falhe uma presença numa final europeia por cair em Braga, com todo o respeito pelo esforço dos minhotos, mas é que a nossa história obriga-nos a estar em Dublin. Se isso não acontecesse podiam começar a pensar em ir todos ao museu do Barça...